Letícia Zuppi
Adriana Calcanhotto vem conquistando o público desde o seu primeiro disco, Enguiço, lançado em 1990. Responsável por encantar as plateias com canções como Mentiras, Metade, E o Mundo Não se Acabou, Senhas, Esquadros, Inverno, Vambora, Mais Feliz, Devolva-Me, Maresia, Medo de Amar, Água Perrier e Cariocas, a artista já teve que ficar longe de seu violão por conta de lesões nas mãos.
Como até mesmo as dificuldades têm o seu lado bom, a cantora e compositora, em sua recuperação, foi indicada a trabalhar com pestanas – acordes de violão e guitarra em que se pressiona as cordas na mesma casa, com o dedo indicador – e, assim, compôs novas músicas com acordes deste tipo.
No momento de compor, Adriana revela que sua inspiração principal para novas canções vem da própria vida e que não precisa de uma disciplina ou de um local especifico para deixar a sua imaginação fluir. “Os métodos são aprisionantes, quanto mais se precisa das coisas ideais, pior. Componho em casa, na estrada…me sinto mais solta hoje”, conta.
Dentro de um repertório variado, as músicas de Adriana Calcanhotto falam sobre o amor, relações, entre outros temas que agradam o público. “As canções mais conhecidas são as românticas, que foram para as trilhas sonoras das novelas”, conta. Adriana explica a identificação de seu público com músicas deste tipo. “Toda música que fala de amor é muito direta, as pessoas aplaudem como se conhecessem”, diz.
Para a cantora, toda canção reflete um pouco do compositor, mesmo em se tratando de situações que ele não tenha vivido. “Não existe canção separada do autor. É tudo misturado, ficção com realidade. As minhas refletem a minha vida”, coloca.
Acostumada a levar ao público shows de qualidade, em que canções como Vambora, Esquadros, Inverno e Maresia não podem ficar de fora, Adriana conta que um tipo de show mais intimista lhe dá mais liberdade de execução e interação com a plateia. “Gosto dos shows solo. O show é sempre mais fechado quando há banda e deve-se seguir um roteiro. Porém só com o violão é possível mais agilidade, essa coisa do ‘pé na estrada’”, diz.
O show com atmosfera íntima e aconchegante como o show solo, exige do cantor uma segurança de contar apenas com si próprio no palco, sem dividir a responsabilidade com a banda, bailarinos, etc. E Adriana tem familiaridade com este universo. “Fiz durante muito tempo shows com voz e violão. Estou acostumada com este formato”, diz.
Segundo Adriana, shows com banda exigem sempre um maior preparo do artista. “Estudei muito para não fazer feio com banda e aprendo muito com os músicos”, conta, em tom de humor. “Fazer somente voz e violão é menos arriscado, é algo mais ‘cara de pau’”, diz.
Em comparação com outras cantoras da MPB, a facilidade de locomoção do show solo de Adriana Calcanhotto impressiona algumas pessoas que trabalham com ela. “Pessoas da equipe estão acostumadas a trabalhar com a Marisa Monte, cujo show utiliza caminhões e containers”, explica.
Tendo passado por diversos locais com seus shows, Adriana destaca a importância de haver, nas cidades, teatros de qualidade, como o Theatro Municipal de Paulínia, onde já se apresentou com o show solo “Olhos de Onda”. “Os teatros estão difíceis no Brasil. Quando uma cidade tem um teatro, um espaço para formação de plateia, esta é uma cidade de sorte”, diz. Segundo a artista, os teatros municipais devem existir afastados de interesses de governo, como um bem para a população. “Os teatros devem se solidificar independentemente da vontade política, sendo que uma administração dê sequência ao que a outra já fez”, comenta.
Com relação ao estudo do canto – parte essencial do trabalho de qualquer cantor – Adriana revela que foi uma boa aluna durante um certo tempo, porém se sentia aprisionada pelas exigências vocais do professor. “Fiz canto lírico em Porto Alegre (onde nasceu) e estudei com um professor que atendia também outras cantoras, mas que era insaciável. Ele me proibiu de tomar café e eu me peguei uma vez no camarim tomando um café frio escondido (risos)”, conta. A partir de seu incômodo com as regras rígidas de cuidado vocal, Adriana decidiu não submeter-se mais a elas. “Passei a me preocupar menos com a voz e tudo ficou melhor”, completa.
Bastante presentes nos shows de Adriana Calcanhotto, os poemas musicados mostram esta outra faceta de trabalho da artista, dando um toque especial as palavras de diversos compositores. “Vejo o poder que os poemas têm. A música que toca o público pode ser direta, crua e até irônica, como o trabalho de Waly Salomão”, conta Adriana, fazendo referência ao poeta brasileiro – já falecido – com quem fez parcerias.
O talento de Adriana é acompanhado por fãs de todos os tipos. A surpresa da cantora foi perceber que as crianças também admiravam o seu trabalho. “Fui percebendo em shows em ginásios uma certa quantidade de crianças sentadas no chão em frente ao palco. Elas gostam da canção Mentiras, que fala ‘quero quebrar estas xícaras, já arranhei os seus discos´, elas criaram uma identificação com meu trabalho”, conta.
Focando este tipo de público, Adriana decidiu fazer um projeto paralelo, com o nome de Adriana Partimpim. A partir do primeiro álbum infantil da cantora – o Partimpim Um, lançado em 2004 – e o sétimo de sua carreira, seu público mirim se estabeleceu. “A partir deste trabalho ganhei mais fãs pequenos e também fãs da terceira idade”, revela. A Partimpim Um seguiram-se Partimpim Dois (2009) e Partimpim Tles (2012).
Com o passar dos anos, um bom cantor deve saber reinventar-se e trabalhar de forma que seu repertório mantenha o público interessado. Para tanto, Adriana diz atentar-se a outros cantores e não perder o frescor a casa show que realiza. “Presto atenção nos artistas que mantem o mesmo repertório e se reinventam, como Mick Jagger. É preciso, a cada apresentação, cantar como a primeira vez e jamais deixar cair no ‘piloto automático’”, finaliza.